Antonio Pereira Sousa

"Aprendi novas palavras e tornei outras mais belas." (Carlos Drummond de Andrade)

Textos


Eu Tenho Um Sonho
 
 
Martin Luther King, Jr. (1929-1968) foi um pastor protestante e ativista político estadunidense. Tornou-se um dos mais importantes líderes do movimento dos direitos civis dos negros nos Estados Unidos e no mundo, com uma campanha de não violência e de amor ao próximo. Ele foi a pessoa mais jovem a receber o Prêmio Nobel da Paz em 1964, pouco antes de seu assassinato. Seu discurso mais famoso e lembrado é "Eu Tenho Um Sonho".
Naturalmente ligamos os sonhos a encantos, a momentos de grandiosidade da alma onde o contentamento reina. No sonho do repouso noturno, o corpo descansa enquanto a alma liberta-se em devaneios. No sonho da vida ativa, corpo e alma reconhecem os enigmas e as peripécias da vida e inquietos constroem o cenário e palco de atuação.  Esses sonhos da vida ativa alimentam a imaginação e dão vigor as esperanças de felicidade, fazendo o pensamento firmar-se na direção de belas realizações.
No discurso de Luther King, o sonho nasce do "[...] enfrentamento de dificuldades de hoje e de amanhã [...]", mas é ato "profundamente enraizado no sonho americano[...]". O sonho assim sonhado é aquele refletido pelo pensador Gerd Bornheim (1929-2002) em sua análise da doutrina do desejo em Hegel e em Marx, quando afirma que “[...] Os sonhos se estruturam e processam dentro de coordenadas históricas e sociais.”
É sonho arrancado das dificuldades postas no tempo em face de diferentes impedimentos e só realizado na firme crença de outro momento possível e grandioso onde, por exemplo, “[...] os filhos dos descendentes de escravos e os filhos dos descendentes dos donos de escravos poderão se sentar junto à mesa da fraternidade” – Luther King.
Pensar o sonho nessa dimensão é ligar esperança à luta e requalificar beleza em tenacidade, na obstinação de agir, como fez a florzinha de Carlos Drummond de Andrade (1902-1987) em sua poesia Flor e a Náusea:


 
Uma flor nasceu na rua!
Passem de longe, bondes, ônibus, rio de aço do tráfego.
Uma flor ainda desbotada
ilude a polícia, rompe o asfalto.
Façam completo silêncio, paralisem os negócios,
garanto que uma flor nasceu
.
É feia. Mas é flor. Furou o asfalto, o tédio, o nojo e o ódio.


 
Essa deve ser a força do sonho e é preciso ter sonhos para viver e tenacidade para decidir. Sonhos forjados na batalha travada para resistir às injustiças e firmeza para construir bem-estares sociais: “[...] Eu tenho um sonho que minhas quatro pequenas crianças vão um dia viver em uma nação onde elas não serão julgadas pela cor da pele, mas pelo conteúdo de seu caráter – Luther King.
O sonhador é o articulador do futuro. Equilibrado no presente, utilizando-se dos materiais de seu tempo, ele, o sonhador, reúne lembranças e sonhos e caminha firme, ultrapassando barreiras, contemplando cenários de luz, e, assim, “[...] Com esta fé nós poderemos trabalhar juntos, rezar juntos, lutar juntos [...] defender a liberdade juntos, e quem sabe nós seremos um dia livres.” – Luther King.
Há nesse modo de sonhar um dado essencial, a mobilidade, o reconhecimento de que o tempo social em que vivemos passa, modifica-se em razão de novas contingências e pede atualização. O sonho é esse traço de união que, sustentado no passado, estabelece o futuro em forma de utopia, de algo a ser alcançado, algo venturoso, canto de sereia que seduz o sonhador a ressignificar horizontes e buscá-los.
Caminhar para realizar sonhos envolve o reconhecimento do problema da constituição do fim da ação, objeto final do desejo. A questão é que o prazer do sonho não deve ser reservado para o fim da ação, mas precisa acontecer no percurso de sua busca, porque o sonho, como a esperança, não se finaliza, renova-se permanentemente para manter a vida do sonhador. Há uma expressão do maior defensor do princípio da não agressão, Mahatma Gandhi (1869-1948), que sustenta essa posição do gozo do sonho enquanto se busca sua realização: “Não existe um caminho para a felicidade, a felicidade é o caminho”. É essa perspectiva que sobrepõe ao ser finito que somos uma aparência de eternidade, feição de ser infinito em razão do poder ilimitado dos sonhos.
Cada um de nós deve construir sonhos e fazê-los acontecer, apesar das adversidades, e, a exemplo de Luther King, afirmar com fé: “Eu ainda tenho um sonho.”
Antonio Pereira Sousa
Enviado por Antonio Pereira Sousa em 01/08/2018
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