O Destino A luta em busca da manutenção da vida é um dado universal de todas as espécies vivas. O diferencial na espécie humana é que nós, nesse esforço de viver a cada dia, acrescentamos mais um instrumento auxiliar que nos facilita conseguir os bens necessários a essa sobrevivência. Ampla é a quantidade desses instrumentos conquistados pela ciência e a tecnologia. Extensos, também, são os arranjos sociais que se constituíram para realizar o modo de produção: como, onde e quanto produzir, para atender a que variedades de interesses. É dentro desse processo de viver que os diferentes projetos sociais são elaborados. Marcamos aí a força fundamental da ação humana, essa aptidão de se projetar para além, criando o novo, modificando formas, alterando modos de relacionamento, influindo em resultados finais alcançados em razão de insistentes buscas. Diversas são as crenças de que existe uma força impessoal, um fluxo vital, através da qual cada indivíduo participaria de uma misteriosa atração que pré-determinaria nossos êxitos ou fracassos. A essa força se denominaria como sendo o impulso do destino. É preciso lembrar que ninguém pode negar com absoluta certeza a inexistência de fatos alheios ao domínio de nossos saberes. Recordemos da sábia expressão do poeta e dramaturgo inglês William Shakespeare (1564-1616): Há mais coisas no céu e na terra, Horácio, do que sonha a tua filosofia. Acolhendo-se o destino como uma força enigmática, ele (o destino) estaria fora do alcance dos poderes da razão. Pensar em destino seria, nesse conceito, supor a existência de um acontecimento imprevisível e inalterável, o que colocaria dúvida sobre a importância do planejamento e da reflexão para agir sob modelos construídos a partir de experiências existenciais acadêmicas e práticas. Em boa parte, na sinuosidade da trajetória que traçamos enquanto vivemos, construímos projetos e, nesse caminhar, mil contingências podem acontecer. As surpresas dos dramas e das tragédias, no ponto de vista da cultura acadêmica, nunca estão armadas com antecedência, são consequências das casualidades presentes no jogo de interesses da construção social. Aceitar a perspectiva de que fora do mundo histórico há uma força capaz de predizer o que seremos num dado futuro aleatório antes da experiência vivida é, de algum modo, acolher a ideia da desnecessidade do exercício de inteligência, a qual se constitui, exatamente, no labor diuturno sob o manto da liberdade, nessa procura do crescimento de nossas possibilidades. Melhor seria ficar com a versão mais segura, a da aventura do desenvolvimento da consciência humana dominando sobre a face da terra e construindo seu próprio destino como representação de sua vontade determinada, ainda que se utilize de ajudas de fora do mundo histórico, como expressou Santo Tomás de Aquino (1225-1274) em sua Suma Teológica: “A história é uma construção dos homens, sob inspiração divina.” Esta é uma forma de dizer que nós somos o nosso próprio destino. Compreendendo bem o nosso tempo, auscultando com cuidado as experiências de um tempo anterior, aplicando com sabedoria nossas forças para vencer barreiras, tornam-se amplas as possibilidades de êxito, de resultado feliz, auspicioso, para nossos projetos. O conhecimento que identifica agora o que somos, ao se conviver com os tempos e contratempos contemporâneos, é o mesmo conhecimento que nos induz a projetar alvos. Isso confere certo grau de certeza daquilo que seremos no futuro. Assim agindo, temos, ao menos, o respaldo do imaginário social a que pertencemos e, nesse bom senso, evitamos tatear às cegas sem saber quem somos, nem o que queremos. Nesse sentido, vale recordar do conselho do Gatinho de Cheshire do livro infantil de Lewis Carroll -1832–1898 - (Alice no País das Maravilhas): Você poderia, por favor, me dizer qual é o caminho para sair daqui? – Pergunta Alice. Depende muito de onde você quer chegar, disse o Gato. Não me importa muito onde, foi dizendo Alice. Nesse caso não faz diferença por qual caminho você vá, disse o Gato.
A quem devemos acompanhar? Seguindo a posição do Gato, estaremos adotando uma racionalidade refletida. Acompanhando a peraltice e o devaneio de Alice, estaremos entregando nosso futuro à incerteza do destino. Antonio Pereira Sousa
Enviado por Antonio Pereira Sousa em 20/07/2018
Alterado em 23/07/2018 Copyright © 2018. Todos os direitos reservados. Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor. |