Antonio Pereira Sousa

"Aprendi novas palavras e tornei outras mais belas." (Carlos Drummond de Andrade)

Textos

 
A Verdade

A verdade é filha do tempo, não da autoridade.”
Francis Bacon (1561 – 1626)
 
Existimos.
Estamos num mundo circunstanciado pelo espaço e tempo que nos são contemporâneos, numa condição de aventureiros, dado que fomos levados a comparecer neste mundo sem nossa escolha, assim como problematizou Paul Ricoeur (1913 – 2005): “Nós surgimos, de certo modo, a meio de uma conversa que já começou e na qual tentamos orientar-nos para fornecer-lhe o nosso contributo”.
O imperativo da verdade surge no seio dessa convivência humana que nos faz atores sociais, de modo que precisamos ordenar e observar direitos e deveres, dentro de esferas sociais em que agimos. São formas de viver e de conviver que trazem como essência conteúdos de ponderação construídos nesse jogo de inventividades instituidor de um mundo melhor que antes, em que se ampliam as liberdades e o domínio das ciências e tecnologias.
Vale lembrar que todos os feitos humanos, para além de seus agentes, somente se configuram, ganham forma ou são identificados à medida que são pensados e narrados por um dos diferentes contornos discursivos (história, literatura, pintura, teatro, cinema, etc.), a exemplo do que conceitua Fredric Jameson (1934): “A história, a não ser sob forma textual, nos é inacessível”
Nesse caso, a morada da verdade é o discurso prudente, um modo de juízo que revela certeza em seu enunciado.
Há, contudo, uma imprecisão imanente em cada olhar de cada um de nós, em face de nossa impossibilidade de enxergar as diferentes faces das coisas, das ações, o que faz de nosso saber ser uma gota d’água num oceano de desconhecimento. E, por isso mesmo, reconhecer a verdade parece exigir sempre uma demonstração de sua certeza.
Os gregos clássicos (V século a I século a.C.) traçaram um caminho, uma forma de ver a verdade. Na tradição grega, o termo verdade (aletheia) carrega um sentido que impõe a necessidade de busca. O termo não se oferece já esboçado à compreensão. Verdade, nesse fundamento grego, é não ocultar, é trazer à compreensão, procurar conhecer, revelar, etc.
Quando se busca a verdade, o interesse é entender um acontecimento, uma expressão, um ato, uma coisa. O método que se utiliza para se alcançar esse interesse é a interpretação.
Trazer à compreensão, dizer que algo é verdadeiro, é obrigar ao interessado interpretar.
Interpretar é procurar entender as variadas faces daquilo que se deseja conhecer. É bom se saber que toda interpretação é relativa e que suas expressões são, infinitamente, passíveis de revisão.
Sendo assim, o que fazer para descobrir a verdade?
O caminho é abrir o coração, ouvir, auscultar o tempo presente sem rancor, para que a leveza do pensamento vislumbre as vias de acesso que revelem a harmonia das intenções e das realizações, desvelando os sentidos implícitos nos feitos e nas ações.
Acolher os sentidos que enobrecem a vida é uma boa base para o reconhecimento da verdade, dado que se ganha habilidade para se identificar gestos, atitudes, vontades historicamente determinadas.
Essa base é aquela que nos faz companheiros, irmãos, colegas, amigos, colaboradores que se fortalecem dentro de instituições sociais: políticas, religiosas, educacionais, científicas, etc.
Nessa redoma da vida enobrecida dentro de nossas estruturas sociais, nos enxergamos como iguais e cuidamos para que o outro se salve conosco nas conquistas do bem-estar (da alma e do corpo) a que temos direitos como herdeiros do tempo.
Em tese, todas as instituições sociais têm esse papel, o de encorajar o abraço no encontro, de não deixar desaparecer o outro, de ser agente da aletheia (verdade). Nesse sentido, chegar à verdade é produzir o efeito do riso na vitória de ver cada um se realizando, vivendo em plenitude, ao poder gozar dos benefícios que o seu tempo e seu espaço promovem.

 
Antonio Pereira Sousa
Enviado por Antonio Pereira Sousa em 20/07/2018
Alterado em 23/07/2018
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