O Trabalho “Comerás o teu pão com o suor do teu rosto [...].”
Gênesis 3:19 Vida ativa. Para sua própria proteção e sobrevivência, o homem elaborou mil bens e todos eles estão à nossa volta: o livro, a casa, a roupa, os instrumentos de trabalho, as maneiras de produzir e utilizar os alimentos... e quantas coisas mais?
É preciso contemplar todas essas coisas e considerar as suas utilidades, reconhecendo que nessa maneira de caminhar, realizando essa tarefa de produzir bens úteis, há um desenvolvimento do espírito humano. Trabalhar é um modo de inventar bens que sustentam formas de viver melhor que antes: o telefone, a anestesia, o computador, etc. Nesse esforço de fazer algo, a nossa inteligência é levada a pensar em saídas, em encontrar bens novos para atender necessidades particulares e coletivas. O trabalho, nesse exercício de fazer esses bens, fez surgir um impasse: quase todo o processo de elaboração dos bens humanos viola a organização natural. Derrubamos a árvore para fazer o papel, extraímos do seio da terra o petróleo e poluímos o ar que respiramos. Nesse sentido, o homem é um elaborador secundário, depende sempre de outra substância no processo de fazer algo. De fato, por longo tempo, em face da abundância dos bens naturais, desenvolvemos uma consciência de que tudo na face da Terra era inesgotável. Embora poluindo os rios, destruindo a fauna e flora, a alma humana do sujeito da ação não se angustiava. O código que apaziguava o espírito do trabalhador era o próprio prazer de laborar, como se sua única missão fosse aquela de prover seu sustento com o suor de seu rosto, independentemente de outras consequências. Ficou esquecido, por tempos, o dever anterior de se cultivar e guardar o jardim do Éden (Gênesis 2:15), que é este espaço em que vivemos, paraíso de onde retiramos todo o substrato para suprir nossas necessidades e possibilitar que as conquistas do espírito se realizem: o bem-estar social, a alegria individual, o usufruto dos bens de seu tempo, etc. Esse mundo idealizado do trabalho humano é atravessado pela demanda de ideologias que fizeram o trabalho ganhar uma feição de castigo para uma massa imensa de trabalhadores, que pouco ou nada se beneficiaram do pão que produziram com suor do rosto; isso fez ser o trabalho um ato inútil para o trabalhador. O fruto do esforço do trabalhador torna-se algo distante e estranho a quem o produziu. Isso corresponde a dizer que, no processo de produção, algumas ideologias interromperam a ligação do trabalhador com o produto, daí a constatação teorizada por Karl Marx (1818 – 1883): “A alienação aparece no fato de que meu meio de vida é de outro [...]”. Essa questão retrata a velha luta pela qual tantas civilizações se bateram nessa busca de como conduzir o modo de trabalho. Não chegamos ainda a uma resposta adequada a essa questão, basta se olhar em torno e o que se observa são injustiças e sofrimentos na contramão das gastanças e privilégios econômico- financeiros de minorias. E quantas teses e teorias acadêmicas não estão acenando por soluções? Uma certeza existe. O trabalho humano é vital. Trabalho este que deve ser pensado e repensado a cada momento. Agora mesmo estamos convivendo com a automação avançada das máquinas e novo drama se coloca nessa procura de bem conduzir o modo de trabalho, novas reviravoltas sociais estão se apresentando em razão dessas modernas formas de relacionamento trabalhistas. Vale acentuar, ainda, que o trabalho contemporâneo reclassificou o conceito de trabalhador. Se, num momento, o trabalhador era apenas o operário, obreiro, proletário, artesão, agora todos somos trabalhadores. Todos nos incluímos nessa rede de produção que atende às necessidades socioeconômicas. Isso passa por todas as categorias que envolvem atividades diversas conhecidas, como: doméstica, religiosa, acadêmica, industrial, comercial, agropecuarista, bancária, de lazer, entre outras. O que parecia nos separar é o que nos une: o trabalho. Dependemos uns dos outros na capacidade de saber realizar atos com eficácia, saber trabalhar com eficiência. Na base dessa dependência está a certeza de que todos nós somos ignorantes e sábios a um só tempo, dependendo, tão somente, do que temos de fazer e do que sabemos desempenhar. Nesse caso, o trabalho em si é uma virtude que enobrece o homem. Cada um tem sua capacidade de contribuir. Embora ainda fragilizada, essa teia de relação dentro do modo de trabalho há de se fortalecer em face da consciência já postulada por tantas sabedorias, a exemplo do artigo primeiro da Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948): “Todas as pessoas nascem livres e iguais em dignidade e direitos. São dotadas de razão e consciência e devem agir em relação umas às outras com espírito de fraternidade”. Mundo do trabalho, mundo onde os homens se encontram como seres que pensam e constroem lugares de cativeiros e liberdades, de dores e risos, de manifestações de anseios e realizações. Lugar adequado à ação e ao discurso, espaço privilegiado de onde se pode esperar do homem o inesperado em face de sua capacidade de realizar o infinitamente improvável. O trabalho é a base que conduz o homem a essa possibilidade de realizar-se, realizando um mundo novo a cada ato. Antonio Pereira Sousa
Enviado por Antonio Pereira Sousa em 23/07/2018
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