Antonio Pereira Sousa

"Aprendi novas palavras e tornei outras mais belas." (Carlos Drummond de Andrade)

Textos


A Fé

 
O homem como ser de uma existência histórica produz suas próprias explicações sobre sua vida. Foi assim nos idos tempos da mais remota antiguidade, nas fases seguintes de nossa vivência e é assim na contemporaneidade.
Desbravando fronteiras, saberes novos foram se instituindo ao lado do desenvolvimento da consciência do que somos e das responsabilidades que temos sobre aquilo que devemos fazer ou deixar de fazer.
Caminhando, realizando, aprendendo, a vida humana gozou de benefícios e padeceu de sacrifícios. Ela deu passos largos nessa aventura de melhorar nossas relações sociais com as conquistas das ciências e tecnologias e teima em manter sem rumo questões éticas que nos igualariam em oportunidades de viver. Temos sido lobo de nós mesmos, numa divisão cruel dos que possuem bens e dispõem de domínios de tecnologias e outros sem esses benefícios sociais. É só olhar em volta.
A ideia aqui é reconhecer a existência de uma prática puramente humana construída e aprendida no decorrer da história. Nessa prática, o homem torna-se medida de si mesmo, fonte de valores e de redirecionamento de suas ações em busca de objetivos. É em razão disso que um dos aspectos da história é a exemplaridade: conhecer mais para errar menos.
É nesse sentido que o termo , no campo puramente histórico, corresponde a confiar, a confiança. Exemplo: a é a confiança que temos no outro. Confiança no “[...] tempo presente, nos homens presentes, na vida presente [...]” (Carlos Drummond de Andrade, 1902–1987).
A partir desse modelo conceitual da fé como confiança, surge o caráter prático da fé, que desliga sua dependência de uma vontade transcendental, fora do espaço de convivência histórica. É aí que a fé se afirma na capacidade de dirigir ação. É na confiança que caminhamos na busca de nossos sonhos, de nossos projetos, daquela utopia pela qual não nos cansamos de lutar.
A utopia, que o presente constroi, é uma imagem positiva do futuro, é um modo de criticar o próprio presente, é uma forma de confiar na força da decisão que assumimos agora para instituir um lugar melhor no futuro. Nisso, a fé se torna potência da vontade inquieta do homem criador de seu próprio mundo, de sua própria história.
Ter fé, nessa ideia de busca do próprio destino, é atribuir sentidos novos a vida e sobrepor significados ainda não experimentados ao mundo. Por isso mesmo, a fé é um exercício de talento, de habilidade daqueles que estão motivados no presente, com os dados do presente, que sabem que inovar é preciso. Novos valores surgem dessa busca, o que faz novo a cada tempo o mundo em que vivemos.
Se prestarmos atenção a esse exercício de confiar e organizar-se para agir, haveremos de notar que aí se enraíza a esperança que faz a nossa alma pressentir a felicidade, esse domicílio do prazer que nos permite viver em contentamento, de bem conosco e com nossa sociedade.
Já vimos que esse sentido antropológico do termo fé, como confiança, nos relaciona com fins. Divisamos objetivos ainda não experimentados e nos dispomos a alcançá-los. Mas, também, se deve reconhecer a existência da dimensão específica dos meios, o aqui e agora, essa realidade concreta e objetiva onde a motivação precisa se apoiar, sem o que a frustração acontecerá.
Em tese, todos os homens querem realizar sua vida, melhorando-a a cada dia, ao utilizar os bens de seu tempo com inteligência. Isso é uma espécie de fé. Sem se confiar na possibilidade de uma vida melhor à frente, a existência perde sabor. É como se a pessoa morresse a cada por do Sol, porque ele só vive aquele dia em que acorda, falta-lhe o projeto, os dias para além do amanhã.
Vale lembrar agora dois grandes pensadores que sustentaram teses encorajadoras dessas decisões que ganharam reconhecimento ao longo dos tempos e que resultaram em benéficas realizações para muitos indivíduos e muitas sociedades, tomando-se a fé como base fundamental:

Tomás de Aquino (1225 – 1274) – Teólogo - Filósofo: O homem é construtor da história, sob inspiração de Deus.
Nicolau Maquiavel (1469 – 1527) – Historiador – Poeta: Toda ação é designada em termos do fim que se procura atingir.

A fé inspira, motiva e salva o sujeito do castigo da mesmice.
Antonio Pereira Sousa
Enviado por Antonio Pereira Sousa em 26/07/2018
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