Visão Literária – Pistas de História O conhecimento da ação social praticada no curso da vivência do homem, em busca de realizar seus interesses, não é privilégio unicamente da História. Outros saberes explicam, desmistificam, revelam diferentes modos de vidas presentes na sociedade: Sociologia, Etnologia, Antropologia, Literatura entre outros. Cada um desses saberes tem sua metodologia e abordagem próprias, mas todos esses conhecimentos contribuem para desvelar os inúmeros aspectos do que somos enquanto cultura. E, por isso mesmo, as complexidades do homem e da sociedade vão se mostrando em seus sentidos e significados.
A Literatura é um corpo de saber que ajuda compreender o homem e a sociedade. A Literatura, enquanto forma de reflexão, é uma narrativa de acontecimentos, narrativa livre. A História é também uma narrativa de acontecimentos, mas narrativa que se subordina à existência de documentos ou de testemunhos. Tomar a Literatura como fonte de História é reconhecer que ela fala de uma realidade externa captada pela sensibilidade do romancista que se aventura a percepções antes insuspeitadas. É em razão disso que a poetisa Sonia Brayner (1979), falando de romances brasileiros do século XIX, afirma: [...] quanto mais o romancista toma consciência do mundo, mais mergulha na trama de sua subjetividade. É possível, então, lendo-se romances, encontrar neles pistas de história. Ler os romances de Jorge Amado é sentir a vida acontecendo na Bahia. Ler Terras do Sem Fim e São Jorge dos Ilhéus seria perceber a peripécia do plantio do cacau no sul da Bahia. Esses dois textos de Jorge Amado, ao representar os tempos idos do desbravamento e plantio do cacau, nos seus dramas mais expressivos, revelaram o tempo da produção literária do autor, por sua linguagem, por sua ideologia. Associando essas duas leituras à leitura dos demais textos, Jorge Amado se mostra, em sua plenitude, filho das terras do cacau, rebelde nos mistérios da Bahia e comunista nas lides partidárias. Não havia como ver o autor e seu tempo sem fazer o encontro com suas obras. Para se compreender o autor há de se conhecer bem seu tempo e suas obras. É buscar conhecer o ponto de vista do escritor, suas intenções e suas interpretações, analisando a ideia literária naquilo que o autor pensou que era o mundo e naquilo que ele testemunhou sobre esse mundo, na consciência de sua reflexão ou na espontaneidade surgida desse vínculo ao qual o processo histórico submete cada um de nós, condicionando-nos. Isso significa reconhecer a época em que Jorge Amado escreveu os dois textos mais representativos da saga do cacau no sul da Bahia: Terras do Sem Fim (1942) e São Jorge dos Ilhéus (1944). Época de grandes tensões, de sonhos, de transformação social intensa. Tudo alimentado pelas vanguardas partidárias, de forte presença ideológica, com suas vertentes de pensamento: comunismo, tenentismo, getulismo, fascismo e integralismo. Nesse clima foi que aconteceu a apreensão, por Jorge Amado, dos sentidos das relações que surgiram no sul da Bahia, no momento em que se deram as lutas pelo plantio do cacau, numa tomada de consciência dos dramas sociais presentes nesse espaço. A literatura amadiana do ciclo de cacau detalha com vigor as dificuldades e os impedimentos para fazer florir o cacaueiro e transformar seus frutos em dinheiro e poder. Os sujeitos dessas atividades conviveram numa diferença absoluta (dominador e dominado) e numa especificidade radical, materializada nas práticas diárias (de mando e de obediência), que fizeram fragmentar o corpo social em coronelismo e trabalhadores braçais. Com esses textos, Jorge Amado pintou alguns afrescos da região cacaueira, compondo não abstrações de um mundo imaginário, mas retratos de homens com quem ele conviveu e de outros de quem ouviu falar. Jorge Amado revelou o modo de viver desses sujeitos frente às épicas lutas pelo domínio das terras para o plantio de cacau. Na visão literária amadiana tem-se pistas da história do sul da Bahia. Antonio Pereira Sousa
Enviado por Antonio Pereira Sousa em 02/08/2018
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