Antonio Pereira Sousa

"Aprendi novas palavras e tornei outras mais belas." (Carlos Drummond de Andrade)

Textos


O Sujeito – O Ator Social
 
Toda sociedade, em todos os tempos, trava suas batalhas, imprime suas ações no interesse de resolver suas dificuldades e faz essas coisas sob o manto de uma ideologia, “um conjunto de ideias, convicções e princípios filosóficos, sociais, políticos que caracterizam o pensamento de um indivíduo, grupo, movimento, época, sociedade”, como postulam os dicionários.
Em toda América Latina e no Brasil, em particular, boa parte das batalhas são travadas, diuturnamente, através de manifestações sociais de decisiva influência e com tal força que saíram do anonimato e vêm fazendo o Estado reconhecer sua existência no campo do direito.
O leque desses movimentos sociais é amplo. Alguns exemplos estão nas manchetes dos jornais diários, vezes vinculadas ao espaço urbano, vezes ao espaço rural, como se pode observar nas lutas por creches, por escola pública, por moradia, transporte, saúde, saneamento básico, dos boias-frias (das regiões cafeeiras, citricultoras e canavieiras, principalmente), de posseiros, sem-terra, arrendatários e pequenos proprietários, de indígenas, negros, mulheres, grupos religiosos, deficientes, homossexuais, entre outros.
Na base desses movimentos está presente a ideia já centenária de que nenhum homem possui autoridade natural sobre o outro e, portanto, esta autoridade entre os homens é somente legitimada pelas convenções sociais, como pensou o filósofo suíço Jean Jacque Rousseau (1712-1778). Todos nós temos direitos de agir e reagir em busca de nossos direitos. De longa data já se reconhece esse direito de espernear, ou como se diz no juridiquês: o “jus sperneandi”.
Sustentando-se em teses como essas, o mundo ocidental reconheceu através da Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948 (Artigo 1º) que “Todas as pessoas nascem livres e iguais em dignidade e direitos”, ou, como deseja nossa Constituição de 1988 (Artigo 5º): “Todos somos iguais perante a lei...”.
O cenário é esse. Todos nós podemos assumir a condição de sujeitos de nossas vidas e de nossa sociedade. Vezes há impedimentos tão brutais que podem nos submeter de tal forma que nos tornamos fantoches, bonecos, simples objetos manipulados por vontades alheias as nossas.
Os movimentos sociais existentes têm em si esse papel pedagógico, o de transformar cada pessoa em sujeito, em ator social capaz de compreender as questões de seu mundo e procurar as saídas mais apropriadas para sua vida e para a vida de sua sociedade. Nesse esforço, o interesse é combinar o fato de "viver juntos", com "nossas diferenças", renovando a figura moderna da democracia, ao reconhecer o pluralismo e manter regras universais de Direito.
Essa consciência dos movimentos sociais tem sido tal que a ideia da defesa do sujeito, entendida como um "desejo" social moderno, atravessa o político, o moral e o ético e começa a se compor como cultura nacional. Veja-se, como exemplo, a decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal (STF), na sessão de 02 de maio de 2012, que reconheceu como sendo Reserva Indígena as terras em disputa da reserva Caramuru - Catarina Paraguaçu, localizada no sul da Bahia, declarando a nulidade de todos os títulos de propriedades dos imóveis localizados dentro dessa Reserva.
A força da reivindicação indígena, nesse processo tomado como simples exemplo, bem demonstra que o sujeito se constrói quando atua conscientemente em busca de seus horizontes. Isso é indicador de que um corpo de racionalização de um movimento social, acompanhado e iluminado por aspirações universalistas (direito a dignidade, igualdade e direito de espernear), envolve todo um grupo como atores, ao responder por interesses retirados da convivência social.
O sujeito dessa convivência social deixa sua condição de indivíduo e torna-se ator ao querer modificar seu meio social, mais do que ser determinado por ele. Ele acolhe o grupo como fundamento da ação e se dissolve na vontade geral do coletivo, como crer o sociólogo francês Alain Touraine (1925):
 
[...] a sociedade molda o seu futuro através de mecanismos estruturais e das suas próprias lutas sociais [...] Ser sujeito é estabelecer um elo entre o universal e o particular, é ensaiar viver o corpo e o espírito, emoção e razão.
 
Antonio Pereira Sousa
Enviado por Antonio Pereira Sousa em 06/08/2018
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