As Faces Do Tempo A vida vive no presente. O hoje é palco e cenário dos eventos acontecendo. Uma explosão de acontecimentos ocorre aqui e ali, em cada canto do mundo, em grau maior ou menor de intensidade: - É a vida, em seu canto de alegria, colorindo as ações, a celebrar as conquistas das bem-aventuranças, sinalizadoras de caminhos na direção do bem-estar; - É a vida, em sua determinação de existir, buscando bens úteis, a suprir necessidades físicas e subjetivas, enveredando-se, não poucas vezes, por caminhos de conflitos, provocadores de sofrimentos infindos. O agora, o tempo presente, este instante, é a face mais aparente do tempo, momento em que a alegria torna-se mais vibrante, porque ouvimos, em sua grandeza, o som do riso que contagia; a dor que fica mais aflitiva, porque percebemos, em sua amplitude, o grito de socorro em cada gota de lágrima derramada. O canto de alegria que se foi e em seu lugar deixou a saudade; as lágrimas da dor que ficaram contidas e se reconfiguraram em ânimo novo, esses sentimentos demandaram a existência de um passado e de um futuro, mas, o hoje não desaparece. As luzes do momento presente são permanentes e envolvem a vida ativa que transcorre e gera um antes e um depois, mas o hoje não desaparece. Embaraçosa questão como já reconheceu o pensador Santo Agostinho (354-430): [...] o passado, de fato, não é mais; o futuro não é ainda. Quanto a um presente sempre presente, que não se vai a um passado, não pertenceria mais ao tempo, seria a eternidade. Viver no presente é estar numa eternidade, embora isso, existe um transcurso. Há um tempo que se foi e outro que há de vir, permitindo que o riso se torne saudade e a dor se reconfigure em ânimo novo a repousar inquietações e reflexões. Ver essas coisas acontecendo, é contemplar o mistério do mundo realizando-se em contextos sensíveis ou se dissolvendo nas dimensões infinitas, lugares somente abertos aos poetas e aos deuses. O tempo se mostra em faces distintas e simultâneas: - Tempo presente é aquilo que se eterniza na grandeza das coisas que permanecem enquanto potência e glória. É aquela feição do mundo representada em princípios e fundamentos: o certo, o errado, a certeza a razão, o amor, o bem, o mal, a felicidade, o belo, a virtude. Viver um princípio é eternizar o modo de ação, reconhecer fundamentos é compreender o sentido das ações: “Eterno, é tudo aquilo que dura uma fração de segundo, mas com tamanha intensidade, que se petrifica, e nenhuma força jamais o resgata!” (Carlos Drummond de Andrade). - Tempo passado é a experiência resultante das ações realizadas. É o tempo evadido do presente que se refugia dos embates do dia a dia, protegendo-se de oscilações do vivido para se tornar princípio, modelo, repositório das certezas, das razões, das alegrias, das glórias, das vitórias, dos sucessos, das genialidades que dão sentido e realidade à vida ativa, à historicidade, fazendo a motivação da busca. - Tempo futuro é a experiência regenerada, posta em atividade após sua purificação no passado e é cunhada agora em forma de utopia, mundo novo idealizado, lugar do encanto onde as sinuosidades da vida se aplanam na confiança da conquista do bem-estar, ali onde a humanidade do homem se realiza: “Aceitar o futuro é aceitar o tempo e poder, então, agir sobre ele” (José Carlos Reis, 1981). Esse tempo assim quantificado nessas suas três faces — passado, presente e futuro — é o tempo humano, tempo relativo. É o tempo da alma ou consciência. Ele é heterogêneo, instável, mas finito como o próprio ser que lhe reconhece, o homem. Há ainda outro tempo, o tempo físico, esse é o tempo absoluto, irreversível e inapreensível, tempo que a todos envolve: não adiantam nossas queixas, o Sol nascerá no dia seguinte, não importam nossos projetos, a noite chegará. Sendo o tempo físico inapreensível, fiquemos, então, com o tempo humano, na perspectiva da poesia de Tempo Rei, de Gilberto Gil: “Não me iludo/ Tudo permanecerá/ Do jeito que tem sido/ Transcorrendo/ Transformando/ Tempo e espaço navegando / Todos os sentidos...”. Antonio Pereira Sousa
Enviado por Antonio Pereira Sousa em 16/08/2018
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