Malandrinha
Malandrinha é uma seresta de 1927, do compositor Freire Junior (Francisco José Freire Júnior — 1881-1956). Malandrinha é um dos seus maiores sucessos. A lua vem surgindo cor de prata
No alto da montanha verdejante A lira de um cantor em serenata Reclama na janela a sua amante Ao som da melodia apaixonada Das cordas de um sonoro violão Confessa um seresteiro à sua amada O que dentro lhe dita o coração. A palavra traduzida na fala do poeta Freire Júnior fez o tempo ganhar ares românticos, quando o realismo já tomava conta do mundo e produzia no Brasil a necessidade de reforma dos costumes, o que de fato aconteceu com modernismo contemplado pela Semana de Arte Moderna (entre 11 e 18/2 de 1922), no Teatro Municipal de São Paulo. Em Malandrinha, o tempo é residual ao fazer renascer um sentimentalismo acentuado. Sentimentalismo este que predominou no século XIX e foi desfeito com a presença das transformações econômicas, políticas e sociais, aproximando as artes de uma nova realidade. Neste momento (século XIX), a poesia, a literatura e as canções passaram a refletir as grandes agitações como a luta abolicionista, a Guerra do Paraguai, o ideal de República. No século seguinte, a década de 1920 acolhe aquelas tensões do século XIX e redireciona a estética, ao construir modos novos de expressão artística, sem desprezar as sensibilidades de um tempo anterior que teima em cantar o Brasil em múltiplas fugas da realidade, deixando aflorar novamente, e com vigor, toda a força de emoção voltada para o eu, para o individualismo, desinteressando-se do coletivo e do social: Ò linda imagem de mulher que me seduz
Ah se eu pudesse tu estarias num altar És a rainha dos meus sonhos, és a luz És malandrinha não precisas trabalhar Malandrinha estaria na contra mão da história da estética brasileira? Na década de 1920, as artes já se inclinavam para as ambições realistas, no corpo do capitalismo industrial. Malandrinha não acompanhou essa tendência. Faltava ao Brasil a consolidação de sua brasilidade cultural, independentemente de sua conquista política de libertação de Portugal (7/9/1822), de seu avanço com a Proclamação da República (15/11/1889) e de suas vitórias econômicas com a exploração de propriedades agrícolas de grande extensão na Velha República (1889-1930). Malandrinha salvaguarda o velho sentimento nativista de valorização da paisagem, interagindo com o lirismo romântico, como se a reafirmar a eternidade de um traço norteando a vida: o lirismo. Acorda minha bela namorada
A lua nos convida a passear Seus raios iluminam toda a estrada Por onde nós havemos de passar Falar ao coração, isso é que faz Malandrinha. Não apenas por sua letra, suas rimas, realizando o encontro de luz, cores, montanha verdejante, lua, como se pintados num quadro para por no centro uma imagem de mulher, mas por ter possibilitado os acordes na sonoridade da voz daqueles que melhor interpretaram esse canto de amor, Malandrinha: Francisco Alves, Orlando Silva, Nelson Gonçalves, Cauby Peixoto, Vicente Celestino, Silvio Caldas, Jorge Goulart, Ivon Curi e muitos outros.
Freire Júnior, ao criar Malandrinha, ajudou a construir a nossa brasilidade, ao pintar de forma densa o colorido de nossa alma verde-amarela, despertando gosto, sabores, jeitos de ser que são apenas nossos, bem brasileiros. A rua está deserta, ó vem querida
Ouvir bem junto a mim, o som do pinho E quando a madrugada, já surgida Os pombos voltarão para seus ninhos. Antonio Pereira Sousa
Enviado por Antonio Pereira Sousa em 20/08/2018
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